"Pode ser que sim. Pode ser que não. Não posso garantir." - in Astérix, A Volta à Gália

26.2.08

Tuguíadas II, 5/6

Maltratar o planeta corresponde
A crime muito grave e sem remendo.
E aquele que o pratica vai p’ra onde,
Se o castigo dos homens não temendo
Prossegue sem saber bem para donde,
Os brutais atentados cometendo
Sabendo que jamais será catado,
E só pelo Senhor será julgado?

A terrena justiça p’ra quem erra
É motivo de grande zombaria;
Quem sofre é sempre a nossa madre Terra
E nunca quem lhe deita a lixaria.
E quando o que se impunha era dar guerra
Aos autores de tanta bizarria,
O que vemos apenas tão somente
É declarar-se tudo indiferente.

(...)

22.2.08

Alguém me explica estes fenómenos?


Note-se que a capa do Record contém outra mentira grave, por cima da que faz a manchete. Era bom era.

20.2.08

Tuguíadas II, 3/4 (continua o choradinho)

Haveria que ser mais cauteloso,
Trazer a Terra nossa mais cuidada,
Nunca por nunca ser ganancioso
A pontos de matar a coisa amada.
Ireis pelo caminho trabalhoso
Ou, pela via fácil, dar em nada?
A morada é de todos, estimá-la
É de todos dever, e não estragá-la.

Como viver com tanta porcaria,
Com tanto desperdício degradante?
Mas o homem, que tanta coisa cria,
Não sabe ou não quer ver mais adiante;
Faz do futuro coisa tão sombria,
Tremida, por demais inquietante;
Se não nos emendarmos só prevejo:
Os amanhãs matamos e sem pejo.

(...)

19.2.08

Ei-los de volta! (os Tuguíadas) (Canto II, 1/2)


Agora, neste tempo pós-Pauleta,
Em que tudo se vai substituindo:
O que era antigo vai para o maneta,
Do futuro os portais se vão abrindo;
Faz o teclado as vezes da caneta,
Vai-se um texto a si mesmo corrigindo…
O que as humanas gentes avançaram
Nos anos muito poucos que passaram!

Veja-se o velho mundo renovado:
De tudo o que é passado faz razia,
Por cada zingarelho que é lançado
Ficamos c’uma nova velharia;
É tanto bem tão mal desperdiçado,
Em nome de ter mais tecnologia!
Mas quando a nossa Terra sustentar-te
Não puder, que farás? Viver em Marte?

(...)

18.2.08

Pristina, não vais levar a mal


Mesmo com um trocadilho logo a abrir, o assunto é sérvio. E o assunto é: a quem é que interessa a independência do Kosovo? Aparentemente os kosovares-albaneses estão convencidos de que lhes interessa a eles, vá-se lá saber porquê e para quê. Mas mas mas...

Para quem faz tanta questão de ser independente custa a entender que agitem freneticamente a bandeira da Albânia. Poderá ser por uma questão meramente estética — especialmente para um português, há que reconhecer que a bandeira não é um problema com que os albaneses* tenham que se preocupar.

Por cá, o secretário de estado não sei do quê já disse que em devido tempo iremos reconhecer a independência do Kosovo. Ou seja, já a reconheceu. Falta só saber que bandeira é que se vai hastear ao pé do Pavilhão Atlântico (será que ficam duas da Albânia?) e o que é que o homem quer dizer com o 'devido tempo', se é que quer dizer alguma coisa.

É provável que, no meio de tantas preocupações com os sérvios do Kosovo e com os sérvios da restante sérvia, com os albaneses do Kosovo e da Albânia, com os romenos e os húngaros da Roménia, com os macedónios da Grécia e os da Antiga República Jugoslava, com os cipriotas gregos e turcos, com os turcos todos e mais alguns, com os russos, com os búlgaros e com as desvairadas gentes que se encontram mais ou menos para aquelas bandas, é provável, dizia eu, que o nosso suprareferido secretário de estado não sei do quê não tenha prestado demasiada atenção a outras questões do mesmo género e que até nos dizem ainda mais directamente respeito.

Já nem estou a pensar na hipótese de a Cova da Moura, por exemplo, querer declarar a independência, com base nos mesmos critérios de natureza étnica. Ocorre-me, claro, o caso da Madeira; mas calculo que o secretário de estado em questão tenha achado que, seja como for, o Alberto João não pode armar mais escabeche do que já faz habitualmente. E também gostava de saber o que é que se vai dizer aos bascos, aos católicos da Irlanda do Norte, aos corsos e a essa rapaziada toda... Que tenham paciência, talvez. É capaz de ser o melhor.

Tal como já havia dito aquando da declaração de independência do Montenegro, parece-me que Portugal faria bem melhor em prestar aconselhamento a estes kosovos, no sentido de pensarem um bocadinho melhor. Olhem para nós e digam lá, sinceramente: o que é que isso adianta? Tenham mas é juízo.

Para acabar, uma cantiguinha da autoria de um tal de Henry Wadsworth Longfellow (1807-1882):

The crescent banner falls
And the crowd beholds instead
Like a portent in the sky
Iskander's banner fly
The Black Eagle with double head [...]


* Ontem ouvi, na TSF, uma portuguesa residente no Kosovo referir-se aos albaneses como os albanos. Não sei se conta como trocadilho mas é bem caçado.

14.2.08

Porquê o S. Valentim?


De onde vem esta celebração do Dia dos Namorados? E será que vai para algum lado? E porquê o S. Valentim? Porque não o Santo António, por exemplo? Ou outro santo qualquer? O Desinfeliz explica tudo (se preferir a versão original, ei-la aqui).

Antes de ser santo, Valentim foi um homem. Há até quem diga que foram mais, uns três ou quatro, mas vamos admitir que foi só um, para não complicar demasiadamente logo no início. Valentim foi, então, nesta versão simplificada dos factos, um homem (e não uma mulher, ou um sapo, ou um jumento).

O mínimo que se exige a um homem que pretenda ver o seu nome associado a um Dia dos Namorados é que perca a cabeça. Valentim percebeu isso e fez-se decapitar, a 14 de Fevereiro de 278 dC, mais coisa menos coisa. Corriam os dias do imperador Cláudio II, o Cruel, e Valentim acabava assim a sua carreira eclesiástica em Roma, de forma algo radical mas absolutamente adequada a alguém que queira virar santo.

Cada governante tem os seus problemas. Sócrates tem o défice e umas chatices com a saúde e a justiça e essas coisas, Hitler agendou o problema dos judeus, Bush tem-se a si próprio, Ramos Horta e Xanana Gusmão tinham o Reinado... Na realidade, todos os governantes têm os problemas todos, mas cada um sente um ou outro problema como mais premente.

Ora o referido Claúdio tinha a ralá-lo a crise do recrutamento. Na altura, Roma envolvia-se frequentemente em campanhas tão sangrentas como impopulares e a necessidade de manter um exército forte esbarrava na falta de vontade dos mancebos em alistarem-se. Ele, Claúdio, atribuía essa falta de vontade a um exagerado e escusado apego dos homens às suas respectivas mulheres e família em geral.


Querendo mesmo resolver o problema e não apenas dar ao eleitorado a ideia de que estava a envidar todos os esforços no sentido de eventualmente criar condições para que em devido tempo se viessem a implementar medidas tendentes a inverter o rumo dos acontecimentos, Cláudio, que não era desses, não esteve com meias medidas: proibiu o casamento. Nem mais nem menos. Em Roma não casarás. Quem não esteve pelos ajustes foi o major. Perdão, o santo. Ou seja, o padre. O Valentim, portanto. Chocado e revoltado com a injustiça do decreto imperial, o valoroso sacerdote continuou a administrar clandestinamente o sacramento do matrimónio aos jovens casais que o procuravam.

Seguiu-se um processo que hoje nos pode parecer estranho, mas que na altura parecia fazer sentido: Valentim foi acusado, julgado e condenado por fazer o que andava a fazer. A sentença não foi propriamente ligeira: Valentim foi condenado à morte à bastonada e subsequente decapitação. E assim se fez. Transitou em julgado, penso que é o termo.

Reza a lenda que Valentim deixou na sua cela uma carta de despedidas à filha do carcereiro(!). A carta terminava com um simpático "Do teu Valentim". Daí aos postalinhos, às caixas de bombons e aos perfumes, não foi mais que uma sucessão de saltinhos graciosos, de nenúfar em nenúfar, de século em século, até aos nossos dias.

13.2.08

Alfredo, o Reinado


Nós, os Alfredos, somos assim. Pelamo-nos por meter medo. Veja-se o grande Hitchcock, veja-se o Stroessner, veja-se este blog… Claro que há excepções, como por exemplo o meu avô. Mas por vezes nós, os Alfredos, exageramos um pouco na ânsia de chamar a atenção. Somos carentes e reinadios, é o que é.

7.2.08

A vida é dura

Não sei se faz parte da legislação de Murphy, mas o facto é que quando as coisas correm mal há uma grande tendência para vir alguém fazer com que piorem ainda um pouco mais. Haja quem o consiga fazer com alguma graça. O seguinte exemplo surge hoje a páginas 13 do Metro, o gratuito, num artigo assinado por Jorge Anjinho sobre a crise do Farense.

Para contextualizar as graves dificuldades do Farense, o artigo apresenta dois exemplos bem sugestivos: um célebre treino no final dos anos 90 em que os atletas se apresentaram com os bolsos dos fatos-de-treino virados para fora e uma entrevista em que um tal Zezinho, por comparação com a situação do seu primo Paixão, defesa do Farense, sublinhava as vantagens de trabalhar nas obras, entre as quais destacava o facto de receber sempre.

Correndo as coisas tão mal para o Farense, qualquer espectador minimamente atento e com um gosto saudável pelas mais genuínas manifestações de rivalidade clubística trataria de arranjar rapidamente um bom lugar para assistir à entrada em cena dos adeptos do Olhanense. Esse espectador atento só teria de esperar pelo derby da temporada 2003/04 (II Divisão B).

Em declarações após o jogo, Carlos Freitas, da claque do Olhanense, resumiu assim a situação: “Quando entraram em campo, atirámos papo-secos para comerem, mas não se devem ter safado porque eram duros”.