"Pode ser que sim. Pode ser que não. Não posso garantir." - in Astérix, A Volta à Gália

31.12.08


Passado o Merry Christmas, contraída, chocada e praticamente utltrapassada uma porcaria de uma gripe, eis então chegado o momento do prometido Pippin New Year.

2009 não vai ser fácil, está mais que visto. Mas já terá havido algum ano fácil, nesses 2009 e nos outros todos antes? No que me toca, vai ser o ano em que vou acabar de ler a Viagem do Elefante, desse outro josé, o saramago, que agora lhe deu para escrever os nomes assim, em minúsculas, vá-se lá saber por e para quê. À parte disso, estou a gostar bastante da Viagem. Algo abaixo do Memorial, do Ano da Morte, do Evangelho, do Ensaio sobre a Cegueira (e quantos escritores terão sequer quatro romances desse gabarito, pergunto eu), mas claramente acima do Homem Duplicado, do Ensaio sobre a Lucidez, das Intermitências da Morte e da Jangada de Pedra.

Outro que vou acabar de ler em 2009, se me conseguir conter nas últimas horas do dia, é este:

Não há adjectivos abaixo de colossal que se apliquem. É quase inevitável que numa próxima visita a este estabelecimento o/a estimado/a cliente venha a encontrar excertos da obra.

Quanto à Guerra de Gaza, não me ocorre nada que não seja desejar a todos os Palestinianos (todos os que habitam a Palestina, em sentido verdadeiramente lato, englobando os israelitas) que sobrevivam também a 2009 e que de alguma forma comecem a viver. Quanto às propostas de tréguas à francesa, em que Israel fica totalmente concentrado na tarefa de levar com os rockets do Hamas, é melhor mesmo nem dizer nada.

Shalom everybody.
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24.12.08


O Pippin New Year fica para depois. Merry Christmas everybody.

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23.12.08

2008, annus terribilis?

Dizem que 2009 vai ser do piorio, mas o ano ainda em curso também não há-de ter sido grande coisa. Só isso pode explicar uma nomeação destas. No ano em que Marx voltou às conversas de toda a gente, apetece dizer que não se volta a frequentar um blog que nos aceita como somos. Mas acho que não sou capaz.

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José, o Padrinho


Uma colega, que por sinal é também minha xará, adoptou recentemente um ursinho de peluche. Quando lhe perguntei como se chamava o pequeno, disse-me que ainda andava de volta desse assunto. Percebeu certamente a minha desaprovação perante tamanha incúria, pois não tardou a convidar-me para padrinho.

Sugeri que fosse Aloísio, naturalmente. A minha homónima gostou muito do nome e o próprio urso não se opôs. Pareceu-me até aliviado, talvez por já se terem sugerido nomes totalmente impróprios para um peluche respeitável.

Creio que José, a Colega, não costuma vir aqui ao Desinfeliz, mas por via das dúvidas não vou dizer o que penso oferecer ao meu afilhado no Natal. O Aloísio era bem capaz de lhe arrancar o segredo e a última coisa que se pretende é dar a um peluche a ideia de que as coisas são como ele quer.

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EXPLICAÇÕES precisam-se

Alguém que me explique matérias como a abstenção do PSD no estatuto dos Açores. E a abstenção do Benfica, já agora. Por favor.

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22.12.08

Ao meu pai, se estiver online

The Delights of Mathematics
Robert Fuller Murray (1863 – 1894)

It seems a hundred years or more
Since I, with note-book, ink and pen,
In cap and gown, first trod the floor
Which I have often trod since then;
Yet well do I remember when
With fifty other fond fanatics,
I sought delights beyond my ken,
The deep delights of Mathematics.

I knew that two and two made four,
I felt that five times two were ten,
But, as for all profounder lore,
The robin redbreast or the wren,
The sparrow, whether cock or hen,
Knew quite as much about Quadratics,
Was less confused by x and n,
The deep delights of Mathematics.

The Asses' Bridge I passed not o'er,
I floundered in the noisome fen
Which lies behind it and before;
I wandered in the gloomy glen
Where Surds and Factors have their den.
But when I saw the pit of Statics,
I said Good-bye, Farewell, Amen!
The deep delights of Mathematics.

O Bejants! blessed, beardless men,
Who strive with Euclid in your attics,
For worlds I would not taste again
The deep delights of Mathematics.


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17.12.08

Figuras e figurões


Confirma-se o que confirmado já estava há muito tempo: Santana Lopes é o candidato do PPD/PSD à Câmara de Lisboa. Não adianta chover muito mais no molhado do espanto, da suposta credibilização do partido que a eleição de Manuela Ferreira Leite supostamente faria supor, do curriculum do candidato, nomeadamente no exercício do cargo a que se volta a candidatar. Não adianta. O facto da candidatura está consumado.

Para que não se consume o facto da eleição (e nos consuma, a nós, lisboetas, a Lisboa, ao país de que Lisboa é capital, ao próprio Mundo a que Lisboa nunca pode deixar de ambicionar pertencer) o que adianta é pensar no que fazer para que Santana não se alape novamente ao tacho e à montra. António Costa aproveitou e bem o tempo que o PPD/PSD lhe deu com o vai-não-vai, é-o-nosso-candidato-não-é-ainda-o-nosso-candidato, pode-ser-que-sim-pode-ser-que-não. A imagem da cigarra e da formiga resume e ilustra bem a situação, dramatiza o que há para dramatizar em época de vacas escanzeladas, chama os bois pelos nomes, é simples e ainda tem a grande vantagem acrescida de ser verídica. Em termos de eficácia de comunicação, que é justamente o terreno em que Santana Lopes se arrisca sempre a triunfar, António Costa dificilmente conseguiria melhor.

Não sei se o PS estará preparado para seguir o exemplo a nível nacional. Claro que ainda nem sequer há a certeza de que seja Ferreira Leite a encabeçar o PPD/PSD nas legislativas (já dando de barato que o PPD/PSD chega às legislativas), mas essa é certamente a hipótese de trabalho que estará em cima das mesas do Largo do Rato (se é que as mesas não estão todas em S. Bento). A imagem da Avózinha e do Lobo Mau parece-me bastante apropriada para esse duelo. A Avózinha dispensa explicações e Sócrates, para além da aptidão natural para o papel do Lobo Mau, conta com uma conjuntura em que o povo (que talvez se possa equiparar ao Capuchinho Vermelho) prefere dentes afiados a dentaduras postiças.

A esquerda, ou melhor, as esquerdas, por muito que lhes dê para crescer, serão sempre os Sete Anões. Por vontade própria e, ou muito me engano, por vontade dos portugueses, que também não hão-de as fazer crescer assim tanto. A comparação com os hobbits Merry e Pippin seria talvez mais adequada, especialmente se nos lembrarmos do episódio em que bebem aquela excelente água dos Ents e crescem um bocadinho, sem no entanto deixarem de ser hobbits, mas os Sete Anões percebe-se muito mais facilmente e tem a vantagem de sugerir imediatamente a Branca de Neve para o papel de Paulo Portas. Quanto a Manuel Alegre, ainda está a tempo de escolher o seu personagem. Tudo indica que se vê como o Flautista de Hamelin, mas não é de excluir a hipótese de continuar Godot. Ou Super-Pateta. Who cares.

Só espero que o fabulário não entre no registo tão português do compromisso, que seria Sócrates a querer fazer-se passar por Lobo Bom. Aí, poderíamos ter um João Ratão a cair no caldeirão e, escusado será dizer, num cenário desses quem se lixa ainda mais é o Capuchinho. Ou seja, nós, os pequenotes.

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10.12.08

Publicidade desenganosa


Primeiro foi o Banco Best, com a conta McCain/Obama. Agora é o Finibanco, com o Depósito a Prazo Vencedores da Liga Sagres 2008. Taxa de juro até 11% para quem acerte nos quatro primeiros classificados (creio que por ordem, senão a coisa perde a emoção). A publicidade avança com uma paráfrase de João Pinto (o Primeiro): Prognósticos, só no Finibanco.

Não sei se as casas de apostas estabelecidas já apresentaram algum protesto por esta concorrência desleal, não sei se o Constâncio, no meio dos seus novos afazeres com o Banco Privado e com as comissões de inquérito, terá tempo para dar alguma atenção a estas trivialidades, não sei sequer se mais alguém está para se ralar com mais esta naifada na imagem e no conteúdo da desejável credibilidade da banca, mas a mim estas coisas preocupam-me. Sou assim.

E mais: o Finibanco aceitará apostas (perdão, depósitos) de pessoas cuja actuação pode ter efeitos directos na classificação da Liga Sagres 2008? Por exemplo: se o Bruno Paixão, o Pedro Proença, o Lucílio Baptista e o Olegário Benquerença chegarem a um balcão do Finibanco e disserem que querem abrir uma conta conjunta, o bancário de serviço limita-se a abrir a dita conta ou liga discretamente para a Maria José Morgado e para o 24 Horas? Se o Hermínio Loureiro constituir o seu depósito, será possível eu saber em quem é que ele apostou? Não é para copiar, é só para saber. E se o Leixões for campeão e o Febolquelupârto ficar em quinto ou pior, haverá uma taxa extra de 42%?

Aqui há uns tempos, o Finibanco assinava a sua comunicação publicitária não com uma frase, como alguns bancos menos ambiciosos, mas com duas: Em privado, porque você é único. Não sei se a assinatura se mantém, mas tudo me leva a crer que os apostadores (perdão, os depositantes) podem contar com uma boa dose de sigilo nos seus prognósticos. O que é pena, porque seria uma excelente oportunidade para saber, ao certo, se os adeptos do Zbordn apostam maioritariamente as suas poupanças no Zbordn ou no Febolquelupârto.

Outro caso de publicidade desenganosa (no sentido de ainda mais transparente do que se poderia exigir) é o dos cartazes do Bloco de Esquerda que dizem assim: O Governo ajuda os banqueiros. E quem ajuda as pessoas?. Calculo o que seria o chinfrim se uma coligação PNR/Manuela Ferreira Leite pespegasse no Marquês de Pombal o seguinte: O Governo dá emprego aos ucranianos e aos cabo-verdianos. E quem dá emprego às pessoas?

O meu prognóstico é que o Bloco de Esquerda, como sempre, ficará isento de responsabilidades pelos seus actos e, mesmo sem chegar aos 11%, terá um excelente resultado quando o povo depositar os votos. Pelo seu lado, o Finibanco pode bem ser um dos próximos temas do Expresso da Meia Noite ou do Prós e Contras, mas por via da massa que o Estado lá venha a meter, e não pelos níveis de criatividade nos terrenos do marketing e da publicidade.
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5.12.08

A questão da avaliação


O modelo de avaliação dos professores e a sua aplicação, ou não, é um assunto importante. Longe de mim desvalorizá-lo. Mas levei muito tempo a perceber a verdadeira dimensão do problema. Agora, felizmente, já tenho opinião sobre o assunto. Com a minha opinião formada, já posso encarar com outra confiança o ano eleitoral que se avizinha, pois, se bem tenho entendido os debates sobre a questão, a maioria absoluta do PS depende deste assunto. E isso, obviamente, é muito mais importante do que a Educação.

Claro que a minha opinião é totalmente irresponsável. Mas, atendendo a que não sou professor, nem sindicalista, nem secretário de Estado, nem sequer ministro da Educação, vou aproveitar esta falha de responsabilidades para dizer o que eu acho, antes que outro assunto qualquer se torne mais importante.

Para que não restem dúvidas sobre o meu grau de envolvimento na matéria, devo declarar que, até há umas escassas duas décadas, frequentei escolas (sempre na qualidade de aluno). Terminei esse meu envolvimento pessoal no sistema educativo sob a tutela do ministro Roberto Carneiro, na vigência do XI Governo Constitucional, o primeiro liderado pelo actual Presidente da República. Um governo em que o Dias Loureiro era ministro dos Assuntos Parlamentares, o das Finanças chamava-se Beleza e havia dois Arlindos (dois). Coisas de outros tempos. Pelo que, actualmente, o que me preocupa mais no que toca a Educação é a minha filha.

A minha filha frequenta uma escola. Não fosse isso e, egoísta e interesseiro como sou, numa altura destas os problemas da Educação poderiam passar-me ao lado. Mas ontem a minha filha chamou-me a atenção para o verdadeiro cerne do problema. E o verdadeiro cerne do problema da avaliação dos professores é a avaliação dos alunos. Eu explico.

Ontem a minha filha telefonou-me, logo pela manhã. Não é hábito. Confesso que, quando o telemóvel tocou e vi o nome da miúda no visor, fiquei preocupado. "Lá estão eles em greve outra vez", pensei eu (eles, os professores). "Lá andam eles a vadiar pelas ruas ou pelos shoppings", continuei eu a pensar (eles, os alunos).

Enquanto ia pensando estas coisas, premi o botão verde e atendi a chamada. Afinal as minhas preocupações não tinham razão de ser. Tudo estava muito bem com a minha filha. Era intervalo, daí o telemóvel estar ligado, e estava a ligar-me para me comunicar que tinha acabado de receber a nota de um teste de Francês. A nota seguia o modelo de avaliação conhecido por "percentagem". Alguma modéstia me impede de a afixar aqui em toda a sua extensão, mas a nota acabava em meio por cento.

Dei-lhe os parabéns, como se impunha, e fiquei a pensar naquele meio por cento. E foi assim que, finalmente, lá consegui perceber o que se passa com a avaliação dos professores. Para que não fique a ideia de que a maioria absoluta do PS se vai decidir por causa da nota da minha filha num teste de Francês, vou ilustrar a situação, tal como ontem passei a vê-la, com toda a nitidez, mas com nomes e valores fictícios.

A cena passa-se na sala de professores de uma escola secundária. Três professores discutem animadamente a questão da avaliação dos professores: Daniel, professor de Artes e Técnicas do Fogo, Bruno, de Filosofia, e Sónia, Matemática. Sentada um pouco à parte, Idália, professora de Francês, está a acabar de corrigir um molho de testes.

Daniel: Eu acho que já ganhámos, pá.

Bruno: Achas? Não sei... Isso do ganhar é tão relativo...

Daniel: Estás parvo ou quê? Não vistes a adesão à greve?

Bruno: Claro, a greve foi um sucesso, mas não tenho a certeza...

Daniel: És mas é maluco, pá. Noventa e tal por cento!

Sónia: 95,4. O sindicato diz que foram 95,4%.

Daniel: E tu, Idália? Não dizes nada? Não me digas que estás do lado da gaja?

Idália (ainda a acabar de corrigir os testes): O quê? Desculpem lá, estava distraída. Estou aqui a acabar de classificar uns pontos... Certo... Certo... Incompleto...

Daniel (piscando o olho a Sónia e Bruno): É pá, ó Idália, deixa lá essa porcaria, já acabas isso. Cá para mim tu estás é do lado da gaja. Eh eh eh!

Idália: Errado... O quê? Desculpa lá, mas tenho de acabar isto. Ontem foi greve, não me ia pôr a corrigir pontos, pois não? E hoje à noite temos a manif, não vou ter tempo. Deixa lá acabar isto, está quase. 62%. Mais um. Certo, certo, certo...

Sónia: Estive a fazer as contas ao modelo de avaliação. Sabem uma coisa?

Bruno: Eu sinceramente não sei muito bem se sei fazer essas contas, mas o conceito de base é que me parece...

Daniel: Tretas, pá. Diz lá, Sónia, quanto é que te deu as contas?

Sónia: 38,8%.

Daniel: Porra! Quarenta por cento?

Sónia: 38,8. Nas minhas contas dá 38,8%.

Bruno: Mas olha lá, Sónia, que conta é essa?

Sónia: É o tempo que a aplicação do modelo de avaliação nos ia levar a aplicar se a aplicássemos.

Bruno: O tempo? Mas achas que o problema é o tempo? Eu sinceramente acho que é mais o espaço. Onde é que a malta vai fazer isso? É aqui, na sala de professores?

Idália: Tu levas 58%. Não, 60%. Olha, só falta um. O Zacarias. Certo... Certo, certo, certo... Este miúdo é bestial. Certo. Bem. Muito bem. Certíssimo...

Daniel: A verdadeira questão, pá, é a gaja. A gaja deve de ir embora. E mais nada. Tu, Sónia, fizestes as contas. Quarenta e tal por cento do tempo é para a gente avaliarmos os colegas. É ou não é?

Sónia: 38,8%.

Daniel: Prontos, quarenta por cento. É a mesma coisa. Não há condições. Cem por cento de adesão à greve, pá...

Idália: Certo... certo...

Daniel: Vêem? Até a Idália concorda, pá. A gaja não chega às eleições. É certinho! Olha, está a tocar. Embora lá, malta.

Daniel, Sónia e Bruno saem. Idália, que tem o próximo tempo livre, conclui calmamente a avaliação.

Idália: Certo e certo. Grande Zacarias. Este miúdo é impressionante. 100%, sem dúvida. Não, espera. A composição está bestial mas falta aqui qualquer coisa. 'Je adore mon petit chien...' Falta aqui a mot juste... E porque não 'J'adore'? Já demos as contracções apostrofadas... Levas 99%, Zacarias. Não. Também não é justo. 99,5%. É isso. 99,5%.

Idália arruma o molho de pontos na sua pasta e sai da sala.

Esta foi a cena que o telefonema da minha filha me revelou. Até ontem, eu não imaginava que um professor de Francês já tinha de chegar ao meio ponto percentual. Afastado da Educação como tenho andado, pensava que só os ministros das Finanças e os bancos centrais é que iam a esse ponto. Agora compreendo. Agora dou razão à justa luta dos professores e respectivos sindicatos. Só para avaliarem correctamente os alunos, já para nem falar em ensinar-lhes coisas, as 24 horas do dia não chegam. Vem agora uma gaja, lá porque é ministra, a querer aplicar modelos de avaliação? Era o que faltava.

Agora que vi claramente as coisas como elas são, a minha opinião é que os professores têm toda a razão. Avaliação sim, mas assim é que não.

2.12.08

Que se passou ontem?

Lá em casa restaurou-se a árvore de Natal.

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