Para que os mais desinformados não fiquem a pensar que o Béria era um daqueles cães que ladram muito e mordem pouco, aqui fica um dos pontos altos do curriculum do animal: depois de mandar despachar o seu velho amigo Lakoba, Béria encarregou-se de torturar pessoalmente a família do defunto. Colocou uma cobra na cela da viúva, o que a levou à loucura, e espancou os filhos adolescentes até à morte.
Nada que não fosse o preconizado várias vezes pelo Mestre Zé (Estaline, entenda-se): "Mais vale uma cabeça inocente a menos do que hesitações na guerra". Ou: "A maior das delícias é marcar o nosso inimigo, preparar tudo, vingarmo-nos totalmente e em seguida ir dormir".
Esta última foi confidenciada a Kamenev, que algum tempo depois proferia em tribunal as suas últimas palavras: "Seja qual for a minha sentença, considero-a antecipadamente justa. Não olhem para trás (dirigindo-se aos filhos). Vão em frente. Sigam Estaline."
Quem também se explicava bem a este respeito era o antecessor de Béria aos comandos do NKVD (escusado será dizer que acabou às mãos de Béria e de Estaline), um anão disforme que dava pelo nome de Iezhov e que chegou ao ponto de especificar que tipo de arbustos deviam ser plantados para cobrir as valas comuns resultantes do seu empenho frenético na função:
"Se, durante esta operação, forem fuziladas mil pessoas a mais, não fará grande mal"; "Batam, destruam sem discriminação"; "Vai haver algumas vítimas inocentes nesta luta contra os agentes fascistas. Estamos a lançar uma ofensiva geral contra o Inimigo; que não haja ressentimentos se empurramos alguém com o cotovelo. Antes sofram dez inocentes do que um só espião consiga fugir. Quando cortamos lenha, as lascas voam".
Este Iezhov é o que aparece e desaparece da fotografia. A ambos os fenómenos (Iezhov e os truques dos photoshops da época) haveremos provavelmente de voltar em posts subsequentes.
"Pode ser que sim. Pode ser que não. Não posso garantir." - in Astérix, A Volta à Gália
31.1.07
30.1.07
Pérolas Vermelhas (I)
Como referi de passagem há alguns posts atrás, tenho atravessado uma fase de alguma indefinição naquele ponto sensível do "na cama com quem?". Comecei por disfarçar a crise com o roupão do Tolkien, já aviei o Pulido Valente e o Paiva Couceiro e, não sei bem porquê, ainda não me deu para me meter com o Rushdie. Vai daí, eis-me de novo na cama com o Estaline & Cª.
O calhamaçov, para além de incómodo, não é particularmente bem escrito e nem sequer está muito bem estruturado. Mas, daquele mar de sangue, vão emergindo algumas pérolas. Exemplos:
Por alturas de 1937 o camarada Estaline faz uma visita à mãe, que se encontrava adoentada. Seria a terceira vez que ia ver a senhora desde a Revolução (em 20 anos, portanto). O que se segue é uma breve mas elucidativa amostra da conversa entre os dois.
— Por que é que me batias tanto? — pergunta o filho.
— Foi por isso que te saíste tão bem — responde a mãe. E pergunta, por sua vez: José, o que és tu exactamente, agora?
— Bem, lembras-te do czar? Sou uma espécie de czar.
— Tinhas feito melhor indo para padre.
O comentário terá deliciado Estaline.
Outro exemplo, sem sair do seio familiar: Artyom Sergeev, filho adoptivo de Estaline, recorda ouvi-lo gritar com Vassili (filho de sangue e de matrimónio) por este explorar em benefício próprio o nome do pai.
— Mas eu também sou um Estaline — protestava Vassili.
— Não, não és — respondia-lhe Estaline. — Tu não és Estaline e eu não sou Estaline. Estaline é o poder soviético. Estaline é aquilo que é nas notícias e nos retratos. Não és tu, nem sequer eu!
Alargando um pouco o círculo para os amigos mais chegados, chegamos ao ambiente de descontracção de umas férias primaveris, numa qualquer dacha. Estaline e Pavel Alliluyev jogavam bilhar com Alexander Svanidze e Stanislav Redens. Quem perdia tinha, tradicionalmente, de gatinhar por baixo da mesa. Quando o par de Estaline perdeu, Pavel sugeriu, diplomaticamente, que os filhos, Kira e Sergei, gatinhassem por baixo da mesa em vez deles. Sergei não se importou, talvez por ter apenas 9 anos, mas Kira, que tinha 18, recusou terminantemente. Insistiu em que Estaline e o pai é que tinham perdido e por isso deviam ser eles a passar por baixo da mesa. Pavel ficou histérico e bateu-lhe com o taco de bilhar.
Última pérola do dia (esta é do velho e bom Béria, a propósito de algum desinfeliz que para o caso não importa quem era):
— Deixem-me tê-lo durante uma noite, e eu faço-o confessar que é o rei de Inglaterra.
Mais pérolas virão, eu temo.
24.1.07
23.1.07
Tuguíadas I, 95/98 (de quando vinham boas novas de Riade)
Depois a Geração de Ouro, novinha,
Conquista o tal lugar, mais almejado.
A canalha, que nem vinte anos tinha,
Traz de volta o troféu mais cobiçado,
Dos reinos dessa Arábia sauditinha.
Co’a Nigéria a final, num disputado
Jogo, que saíu ganho e a contento,
Por dois e não apenas por um tento.
Tozé, o capitão, a taça amada,
Beijava e pelos outros dividia,
Da turma de Queirós bem comandada.
Ilustre gente já se distinguia,
Entre uns poucos, que nunca deram nada,
Muitos outros o Mundo aplaudiria:
Brassard, que na baliza se postava,
E o Peixe, que de todos destacava,
Dois Coutos, igualmente, mas não manos,
Hélio, Folha, Bizarro, gente rara,
João Vieira Pinto, em verdes anos,
No grande Paulo Sousa não repara
Só quem nos olhos tem mui graves danos,
Valido e mais Filipe, (a quem lembrara?)
Dois Paulos, o Madeira (quem diria?)
Mais o Alves, Abel Silva (pontaria
Não lhe faltou no crítico momento!),
Morgado e mais Resende e não findou
Sem Amaral, o tal assentamento
De quem a taça d’oiro conquistou.
Nunca jamais, apenas c’o argento
O povo, após tal feito, se bastou.
A fasquia, que dantes entravava,
Agora mais que nunca nos chamava.
(...)
22.1.07
Mais uma ligação, mais uma linkagem
O Desinfeliz não é pródigo em links. Nunca percebi se isso é bom ou se é mau, se interessa ou não, se é de mau ou de bom tom. Na verdade, nunca me preocupei muito com isso. E tenciono continuar assim, a não me preocupar muito com isso. O que não me impede de, muito ocasionalmente, dedicar um módico de atenção a esse assunto. Isso aconteceu hoje e produziu efeitos, que qualquer scroll até lá abaixo poderá comprovar. Saíu o Google News, que estava lá por defeito e provavelmente sem proveito nenhum para ninguém, e entrou o meu amigo João Nunes, que só ainda não constava da pequena lista por manifestos defeitos meus: a tal despreocupação com o assunto em geral, uma certa preguiça e também alguma ingratidão, pois (que eu saiba) o joaonunes.com foi, até agora, a única voz que chamou a atenção da blogosfera e do planeta em geral para a existência dos Tuguíadas. Em indo lá, recomendo uma olhadela à Guerra das Estrelas Muda.
18.1.07
Votar ou não votar, eis a questão
Não havendo eleições à vista, para ir entretendo vamos ter a segunda mão do referendo do aborto. Já se tendo visto, nas ocasiões anteriores, que os referendos não são propriamente casos de sucesso em termos de mobilização do voto, eis que, em boa hora, surge também a eleição do Grande Português de todos os tempos.
Claro que um homem pode sempre abster-se, como em qualquer outra eleição. Mas, até chegar a essa sábia decisão, não fica mal considerar as outras hipóteses.
Comecemos então pelo princípio, por Dom Afonso Henriques. Com muita pena minha, atendendo ao respeito e admiração que nutro pela mandatária do candidato, este não levará seguramente o meu voto. Parece-me muito deprimente, quase 900 anos depois, chegar-se à conclusão que o melhor português de todos foi o primeiro. Chega a ser falta de consideração pelo próprio Afonso Henriques e pela trabalheira que lhe deu inventar o país. Seria apropriado para um país recém-criado, ou para um país maioritariamente povoado por gente tão orgulhosa que a única forma de não ferir susceptibilidades fosse atribuir os louros ao pai da pátria. Sendo Portugal e os portugueses o oposto disso, o Dom Afonso Henriques terá de passar sem o meu voto.
Segue-se, na ordem alfabética, Álvaro Barreirinhas Cunhal. Não tenho problemas em renunciar ao direito ao segredo do voto: em vida dele, cheguei a votar no partido dele. E não excluo a posssibilidade de voltar a votar no PCP (tal como não excluo voltar a votar no PPM, por exemplo). Mas duvido que o próprio Cunhal gostasse de se ver ali, naqueles preparos, a ver quem é O Maior. E mais: um homem que passou a vida toda a lutar, entre outras coisas, pela unidade e contra o trabalho de fracção, dificilmente gostaria de ver ganhar um candidato tão fracturante quanto o próprio.
Next: Salazar, António Oliveira de. Para além de fracturante, para não lhe chamar outras coisas, este seria talvez um óptimo candidato ao título de O Mais Portuguesinho de Todos os Tempos. Mas o título em disputa não é esse. E, se por algum acaso eu me fosse preocupar com o que o próprio poderia pensar a respeito disto, tenho a certeza que nunca aprovaria um método de escolha que passasse pelo voto dos portugueses. Adiante, portanto, que atrás vem Gente com maiúscula.
Segue-se o candidato-revelação, Aristides de Sousa Mendes. O nosso Schindler. O Manuel Alegre desta eleição. Mas, e aqui o mandatário Júdice marcou três pontos logo no primeiro lançamento, este candidato pode ser visto de outras formas muito mais interesssantes: não só como o segundo candidato de toda a gente (o menos fracturante), mas também como exemplo do que qualquer português pode fazer na medida das suas possibilidades, e como exemplo do que qualquer português deve fazer no plano da ética e da moral, se necessário contra o poder e a ordem, com princípios e coragem em vez de subserviência e medo. Vistas assim as coisas, confesso que ainda não decidi não votar neste.
Fernando Pessoa. Será sempre uma hipótese, e não podia estar mais bem mandatado. O que me desassossega é a concorrência do Camões...
Infante D. Henrique. Este tem o problema de vir num pacote, na turma dos Descobrimentos. E aí a minha preferência vai para o D. João II.
Assim sendo, ficamos também conversados sobre o Vasco da Gama.
Camões. Mais um que faz um homem hesitar em abster-se. Candidato fortíssimo, temível, por quem sinto um fraquinho, indisfarçável.
E resta o Marquês de Pombal. Claro que, numa segunda volta contra o Salazar, nem haveria hesitação nem questão de engolir sapos. Mas, por mais esclarecido, déspota é déspota. E, neste caso, o mandatário não me parece que vá ajudar grande coisa à causa.
Destarte, e numa primeira abordagem, o Desinfeliz balança entre um Camões e uma abstenção, com um pouco de Mendes, de Pessoa e de D. João II pelo meio.
Claro que um homem pode sempre abster-se, como em qualquer outra eleição. Mas, até chegar a essa sábia decisão, não fica mal considerar as outras hipóteses.
Comecemos então pelo princípio, por Dom Afonso Henriques. Com muita pena minha, atendendo ao respeito e admiração que nutro pela mandatária do candidato, este não levará seguramente o meu voto. Parece-me muito deprimente, quase 900 anos depois, chegar-se à conclusão que o melhor português de todos foi o primeiro. Chega a ser falta de consideração pelo próprio Afonso Henriques e pela trabalheira que lhe deu inventar o país. Seria apropriado para um país recém-criado, ou para um país maioritariamente povoado por gente tão orgulhosa que a única forma de não ferir susceptibilidades fosse atribuir os louros ao pai da pátria. Sendo Portugal e os portugueses o oposto disso, o Dom Afonso Henriques terá de passar sem o meu voto.
Segue-se, na ordem alfabética, Álvaro Barreirinhas Cunhal. Não tenho problemas em renunciar ao direito ao segredo do voto: em vida dele, cheguei a votar no partido dele. E não excluo a posssibilidade de voltar a votar no PCP (tal como não excluo voltar a votar no PPM, por exemplo). Mas duvido que o próprio Cunhal gostasse de se ver ali, naqueles preparos, a ver quem é O Maior. E mais: um homem que passou a vida toda a lutar, entre outras coisas, pela unidade e contra o trabalho de fracção, dificilmente gostaria de ver ganhar um candidato tão fracturante quanto o próprio.
Next: Salazar, António Oliveira de. Para além de fracturante, para não lhe chamar outras coisas, este seria talvez um óptimo candidato ao título de O Mais Portuguesinho de Todos os Tempos. Mas o título em disputa não é esse. E, se por algum acaso eu me fosse preocupar com o que o próprio poderia pensar a respeito disto, tenho a certeza que nunca aprovaria um método de escolha que passasse pelo voto dos portugueses. Adiante, portanto, que atrás vem Gente com maiúscula.
Segue-se o candidato-revelação, Aristides de Sousa Mendes. O nosso Schindler. O Manuel Alegre desta eleição. Mas, e aqui o mandatário Júdice marcou três pontos logo no primeiro lançamento, este candidato pode ser visto de outras formas muito mais interesssantes: não só como o segundo candidato de toda a gente (o menos fracturante), mas também como exemplo do que qualquer português pode fazer na medida das suas possibilidades, e como exemplo do que qualquer português deve fazer no plano da ética e da moral, se necessário contra o poder e a ordem, com princípios e coragem em vez de subserviência e medo. Vistas assim as coisas, confesso que ainda não decidi não votar neste.
Fernando Pessoa. Será sempre uma hipótese, e não podia estar mais bem mandatado. O que me desassossega é a concorrência do Camões...
Infante D. Henrique. Este tem o problema de vir num pacote, na turma dos Descobrimentos. E aí a minha preferência vai para o D. João II.
Assim sendo, ficamos também conversados sobre o Vasco da Gama.
Camões. Mais um que faz um homem hesitar em abster-se. Candidato fortíssimo, temível, por quem sinto um fraquinho, indisfarçável.
E resta o Marquês de Pombal. Claro que, numa segunda volta contra o Salazar, nem haveria hesitação nem questão de engolir sapos. Mas, por mais esclarecido, déspota é déspota. E, neste caso, o mandatário não me parece que vá ajudar grande coisa à causa.
Destarte, e numa primeira abordagem, o Desinfeliz balança entre um Camões e uma abstenção, com um pouco de Mendes, de Pessoa e de D. João II pelo meio.
11.1.07
A Luz ao fundo do túnel no Médio Oriente!
Aviso desde já que vou abordar simultaneamente (ou seja, misturar) dois assuntos de enorme importância: o Sport Lisboa e Benfica e a situação no Médio Oriente. Porquê? Porque o segundo assunto não é tão pouco importante como isso e porque, desinfelizmente ou talvez não, a vida não é só futebol.
Vamos aos factos: o Sport Lisboa e Benfica fez mais uma vez aquilo que lhe cumpre e aquilo para que é talhado, que é vencer. Neste caso, o que o Benfica ganhou (para além de mais glória e mais um milhãozito ou outro) foi o Torneio do Dubai.
Os não-benfiquistas, e entre estes a sub-espécie dos anti-benfiquistas, poderão fazer de conta que nada disto tem importância. Os analistas e os responsáveis políticos, bem como uma boa parte da comunicação social considerada séria e de referência, podem, muito simplesmente, deixar que o seu habitual snobismo os impeça sequer de tomar conhecimento dos factos, só porque têm a ver com o desporto (e logo para mais o futebol, pois se fosse cricket, golfe ou ténis ainda se poderia dar o caso de alguma mente mais lúcida dar a devida atenção ao acontecimento e às suas possíveis repercussões).
Voltemos aos factos (maioritariamente recolhidos em fontes tão respeitáveis e insuspeitas quanto a Wikipédia e o Site Oficial do SLB). Para quem não saiba, o Dubai é um dos sete Emiratos Árabes Unidos, que ficam ali como quem bordeja o Golfo Pérsico e também o Golfo de Oman. Com o vento a favor, uma cuspidela ou mesmo um barril de petróleo lançado para norte pode facilmente atingir o Irão. Se, pelo contrário, o vento soprar para sul, o atingido será a Arábia Saudita. Por aqui se pode ver a importância geo-estratégica do Dubai e dos seus pares (importância tal que, noutros tempos, estes territórios eram denominados Estados Truciais, e não al-Imarat al-Arabiya al Muttahida, como sucede agora).
Continuando no domínio dos factos: cabendo ao Abu Dhabi o Califado desta união de Emiratos, o cargo de Primeiro-Ministro está entregue ao Emir do Dubai. E, pelos vistos, não podia estar em melhores mãos. O actual, Sua Alteza o Sheikh Mohammed bin Rashid Al Maktoum, para além de se poder orgulhar da bandeira do seu Dubai (que se descreve numa só palavra: encarnada e branca), teve em boa hora a ideia de apadrinhar e acolher um Torneio de Futebol. Convidou, para o efeito, um grande clube de um pequeno país (o Sport Lisboa e Benfica), um grande clube de um grande país (o Bayern de Munique), um clube médio de uma grande cidade (a Lázio de Roma), e um clube qualquer de um país mérdio (o Marselha).
Só a escolha deste elenco revela os dotes de estadista e a perícia diplomática que tanta falta fazem, de momento, entre os maiores actores do drama político mundial, e muito em especial nos palcos do Médio Oriente. Ao não convidar o Cosmos de Nova Iorque, o Manchester United, o Chelsea, o Maccabi de Tel-Aviv, o Al Ahly ou qualquer outro dali ao pé, este bom homem afastou de imediato qualquer possibilidade de aproveitamento político do evento. Mais: ao convocar apenas equipas europeias (europeias no sentido estrito, ou seja, do continente europeu, britânicos à parte), S.A. o Sheikh Mohammed bin Rashid Al Maktoum forçou a Europa a fazer aquilo que toda gente reclama, de Ana Drago a Pacheco Pereira, de Ana Gomes a Nuno Rogeiro, passando pelo próprio Mário Crespo: intervir na zona, ter uma voz na região, assumir o seu papel de jogador no terreno.
Ora, quem melhor que um Petit para intervir na zona sem receios? Que voz melhor que a de Beto para se fazer ouvir acima dos gritos da discórdia e dos rebentamentos de mísseis ou de bombistas suicidas? Quem melhor que Fernando Santos, engenheiro e profundamente católico, para levar a cabo essa obra aparentemente impossível que é construir a paz no Médio Oriente? Mais que Emir do Dubai, mais que Primeiro-Ministro dos Emiratos Árabes Unidos, S.A. o Sheikh Mohammed bin Rashid Al Maktoum é um visionário e um potencialíssimo Nobel da Paz.
Claro que, voltando aos factos, nada disto levaria a lado nenhum se ganhassem os franceses, ou os alemães, ou os italianos. Tanto em termos futebolísticos como em termos militares, está muito visto e podia ser sempre um pouco assustador para alguém. O que está certo é ser o grande clube do país pequeno (pequeno, mas fundador da NATO, note-se) a triunfar. Claro que, a vencer o Benfica (como seria de desejar, a bem da Humanidade), melhor seria que isso acontecesse de uma forma o mais pacífica possível. E assim foi. Dois jogos, dois empates a zero. Nada de dominações, nada de ataques gratuitos, nada de estratégias suicidas, nada de minimamente ofensivo fosse para quem fosse. Depois os penalties. Contra o Bayern, Moreto resolve a questão com duas defesas. No Pentágono, na Casa Branca, no Knesset, no nº 10 de Downing Street, em cada mesquita e na casa de cada benfiquista teme-se o pior. Como em qualquer situação delicada que se preze, há um momento em que parece que tudo está perdido. Mas, no momento decisivo, nos penalties da final, Moreira responde com três defendidos, o último dos quais a remate do guarda-redes contrário. E, para acabar com um toque de esperança no futuro, o golpe de misericórdia é dado por Pedro Correia.
“Foi pelos pés (e mãos) de dois produtos das suas escolas de formação que o Benfica terminou em estilo a sua participação no Torneio do Dubai”. As palavras, como as aspas indicam, não são minhas. Vieram daqui, com distanciamento e talvez mesmo com algum excesso de modéstia. O que aconteceu no Dubai foi uma grande lição para todos nós, a começar e a acabar nos benfiquistas, mas sem esquecer os sunitas, os xiitas, os curdos, os marines, a Mossad e o Ahmadinedjad. Pedro Correia, uma estreia absoluta, jogou de início, não revelou nervosismo, possui técnica, gosta de subir no flanco e sabe centrar. Marcou o penalti decisivo e foi devidamente recompensado com uma saraivada de caldunços como poucas vezes tenho visto, mesmo naquela zona do globo. Para dar só um exemplo do comportamento das nossas tropas, a atitude do próprio Marco Ferreira, que também não falhou a sua grande penalidade, é classificada como excelente em todos os relatórios que consultei. Quantos daqueles gabirús que andam lá metidos naquela confusão toda se podem gabar de uma folha de serviços destas?
Finalmente (é mesmo para acabar, prometo), só mais um facto: quem decidiu que era ele que ia assumir o risco do pontapé da marca da grande penalidade foi o miúdo, o Pedro Correia. Não foi o Mister, não foi o Engenheiro. Este facto encerra em si a maior das lições e o mais fecundo dos ensinamentos. Com menos interferências externas, e com mais confiança em jovens destemidos mas que saibam levar uns caldunços com fair-play, não há nada que não se resolva. Mesmo com o Irão em cima, a Arábia Saudita em baixo e o Moreto por perto.
10.1.07
7.1.07
Clubes do coração
Não posso dizer que sou do Atlético desde pequenino. Por este Desinfeliz abaixo, hei-de ter deixado escapar, aqui e ali, uma certa preferência pelo Sport Lisboa e Benfica. Mas há espaço no coração de um homem para mais que um clube. O Olhanense, por exemplo, é um excelente exemplo.
Pequeno será, ainda assim, o coração que não consiga albergar dentro de si a simpatia por mais que dois clubes. No meu músculo cardíaco cabem aqueles com os quais toda a gente simpatiza, como sejam a Académica, o Belenenses, o Vitória de Setúbal, o Real Madrid, o Vasco da Gama (o de Sines, não o do Rio de Janeiro), o Ajax de Amesterdão, mais recentemente o Chelsea... e o Atlético.
Vão perdoar-me os adeptos do Oriental e os de outros clubes geograficamente mais afastados, mas o facto é que a minha vida tem sido uma sucessão de aproximações ao Atlético Clube de Portugal. Começando pelo princípio, nasci lá. Não exactamente na Tapadinha, mas em Alcântara, no Hospital do Ultramar, hoje denominado Egas Moniz. Acabado o liceu e o 12º ano, foi lá, em Alcântara, que cumpri aquilo a que se convencionou chamar estudos superiores. Foi no ISCSP, pertíssimo do Hospital de origem e na direcção da Tapadinha. Foi na porta da Junta de Freguesia de Alcântara que vi afixado, com estes mesmos olhos que neste momento fitam o ecrã, o papel que atestava o meu destacamento para a Reserva Territorial das Forças Armadas. Foi na antiga FIL que vivi a primeira festa do Avante. Foi na mesmíssima FIL que vi a Dina, ao vivo. Foi a bordo de um autocarro da carreira 56, saído da mesmérrima FIL, que pela primeira vez me atirei à moça que é hoje a minha legítima esposa. Foi no/a Promotora que vi pela primeira vez a Laranja Mecânica (a do Kubrick, não a selecção holandesa). Muito recentemente, vivi lá durante três anos. Lá, em Alcântara, a escassas centenas de metros desse mítico campo da Tapadinha. Quantas vezes, em faltando o tabaco a horas avançadas, foi ao Bingo do Atlético que recorri para me abastecer. Aí fui sempre recebido com enorme simpatia. Sempre me deixaram entrar com o cão (não na sala de jogo, note-se, mas no hall de entrada, onde se situa a máquina de dispensação automática de maços de cigarros) e nunca me negaram os trocos necessários à operação. É ao restaurante do Mercado de Alcântara que me dirijo, de quando em vez, para comer um salmonete grelhado em condições, ou mesmo mais que um...
É por tudo isto que sinto que, afinal, até posso dizer que sou do Atlético desde pequenino.
2.1.07
Piratas das Caraíbas 3
Recomendo vivamente (pelo menos a versão original inglesa; não sei se já está traduzido). É o livro dos livros, mas não é Esse em que podereis estar a pensar. Passo a explicar. Como sempre acontece pelo Natal, há uma ou outra prenda que pede para ser trocada. Deu-se esse caso, lá em casa, com os Piratas das Caraíbas 2. Eu recebi um exemplar, a minha filha recebeu outro e nenhum dos dois insistiu em ter uma cópia só para si. Muito consensualmente, decidiu-se que um Piratas das Caraíbas 2 fazia falta mas dois Piratas das Caraíbas 2 era excessivo e desnecessário. Daí a ir à Fnac trocar um deles não foi mais que um passito. Aí, na Fnac, os Piratas das Caraíbas 2 transformaram-se em livros, um dos quais é aquele a que me refiro (já, já de seguida, prometo).
Chama-se Tolkien's Gown (& other stories of great authors and rare books) e, na contracapa, há um tal de David Lodge que resume perfeitamente a situação: "The perfect bedside book for bibliophiles". A parte do bedside book, do livro de cabeceira em sentido amplo, que inclui também uma certa portabilidade, posso confirmá-la por experiência própria. A colheita natalícia, em matéria de livros, não foi muito pródiga; donde, dei por mim na cama, durante uma ou duas noites, com o Estaline. Ora, o Estaline enquanto homem não passava de 1 metro e 65, mas o livro é um calhamaço de todo o tamanho, muito pouco apropriado à leitura horizontal. Este Tolkien's Gown é maneirinho e, para além do capítulo dedicado ao Tolkien e respectivo roupão (que foi o que me atraíu na estante, confesso), tem aquilo a que o autor (Rick Gegoski) chama biografias de livros de malta tão distinta, díspar e por vezes disparatada como Nabokov, Joyce, Hemingway, Eliot, Orwell, Greene, Rushdie, Oscar Wilde, Evelyn Waugh, Salinger, Kerouac e mesmo J. K. Rowling.
Os Piratas das Caraíbas 2, do que já vi, parecem-me um bocado abaixo do 1. Já quanto a este, o 3, só posso mesmo é voltar a recomendá-lo vivamente. O Estaline (livro) também não é mau de todo, mas pessoalmente prefiro lidar com ele no sofá ou na casa de banho.
Chama-se Tolkien's Gown (& other stories of great authors and rare books) e, na contracapa, há um tal de David Lodge que resume perfeitamente a situação: "The perfect bedside book for bibliophiles". A parte do bedside book, do livro de cabeceira em sentido amplo, que inclui também uma certa portabilidade, posso confirmá-la por experiência própria. A colheita natalícia, em matéria de livros, não foi muito pródiga; donde, dei por mim na cama, durante uma ou duas noites, com o Estaline. Ora, o Estaline enquanto homem não passava de 1 metro e 65, mas o livro é um calhamaço de todo o tamanho, muito pouco apropriado à leitura horizontal. Este Tolkien's Gown é maneirinho e, para além do capítulo dedicado ao Tolkien e respectivo roupão (que foi o que me atraíu na estante, confesso), tem aquilo a que o autor (Rick Gegoski) chama biografias de livros de malta tão distinta, díspar e por vezes disparatada como Nabokov, Joyce, Hemingway, Eliot, Orwell, Greene, Rushdie, Oscar Wilde, Evelyn Waugh, Salinger, Kerouac e mesmo J. K. Rowling.
Os Piratas das Caraíbas 2, do que já vi, parecem-me um bocado abaixo do 1. Já quanto a este, o 3, só posso mesmo é voltar a recomendá-lo vivamente. O Estaline (livro) também não é mau de todo, mas pessoalmente prefiro lidar com ele no sofá ou na casa de banho.
Mais um Namarië a 2006 e mais um Alô a 2007
1.1.07
Mais um ano e mais ou menos uns nomes
2007 começa inegavelmente melhor que 2006. À escala mundial, começa com dois reputadíssimos filhos de puta a menos: o já mencionado Pinochet e Saddam. Claro que, a propósito dos curricula de cada um e dos respectivos finais, muito haverá a dizer. Mas não é aqui. Aqui passa-se à frente, assinalando apenas a evidência aritmética: são dois filhos de puta a menos. Claro que o mundo não vai melhorar por isso, mas podem ser sinais de uma conjugação astral mais positiva.
À escala tuga, há também duas baixas a registar com alegria no activo deste início de ano: Sampaio e Souto Moura. Filhos de puta não seriam (talvez até lhes faltasse uma costelazita disso para desempenharem melhor os respectivos papéis), mas que o país assim tem mais umas hipóteses, lá isso tem. A República passa a ter um Presidente e um Procurador-Geral e, querendo, pode também interpretar estas abençoadas saídas como sinais astrais positivos.
A propósito de nomes (e sem querer emular as recentemente referidas listas de Saramago), aqui fica uma lista patusca de nomes. É um 'best of' das primeiras páginas de um livro sobre um outro patusco de primeira: Estaline, nem mais nem menos. O livro (bastamente divulgado em tudo o que é jornal, revista ou programa de TV) é da autoria de um Simon Sebag Montefiore e tem como subtítulo A Corte do Czar Vermelho. Um pouco à maneira do que geralmente acontece na dramaturgia, antes de se ir à acção apresentam-se os cromos. Passada a indispensável introdução e os sempre educados agradecimentos, vêm As Personagens, subclassificadas em Família, Aliados, Generais, Inimigos e Ex-Aliados e "Engenheiros da Alma Humana" (sic). Aqui ficam alguns com nomes bem engraçados (para não serem sempre aquelas listas dos brasileiros). Quando não é o nome, há o pseudónimo, o nom de guerre (como o do próprio Estaline, que nasceu Iosebo Djugachvili, como toda a gente sabe) ou a simples alcunha.
Ora então cá vai, por ordem de entrada em cena: O Tio Lara (alcunha de Lavrenti Béria, chefe da secreta e responsável pela bomba nuclear), O Canalizador (Nikolai Bulganine, presidente da câmara de Moscovo e putativo herdeiro do Zé dos Bigodes), O Amora (Nikolai Iezhov, também conhecido como Kolya e também chefe do NKVD), Lazar Kaganovitch (isto era o nome real, as alcunhas eram O Lazar de Ferro e A Locomotiva), O Demónio Sombrio ou Tubarão (neste caso o nome no B.I. e no cartão do Partido era Lev Mekhlis), Akaki Mgeladze (fosse por dificuldade em pronunciar o nome deste tipo, fosse por o tipo ser abcaziano, ou simplesmente por ser mauzinho, Estaline chamava-lhe O Lobo), Viatcheslav Molotov (um homem com nome de pudim e de cocktail/arma de destruição-não-maciça poderia bem contentar-se com isso, mas não; Molotov era comummente chamado, pelo círculo mais chegado, O Cu-de-Pedra; sempre rigoroso, Molotov insistia que a alcunha correcta, que lhe tinha sido dada pelo próprio Lenine, era Cu-de-Ferro), O Cu de Estaline (este Cu agora é outro, é um Grigori Ordzhonikidze), Bronka Metalikova Poskrebicheva (de nome, não de alcunha).
Bom Ano a todos é o que se deseja (a todos vós, desinfelizes leitores, e não a todos os anormais acima mencionados, obviamente).
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