"Pode ser que sim. Pode ser que não. Não posso garantir." - in Astérix, A Volta à Gália

28.6.06

Ustédes ou Avecs, era a questão


E não era uma questão completamente despicienda, atendendo a que há probabilidades, por marginais que sejam, de ainda levarmos com alguém dessa gente. E quando digo marginais é porque me lembro, vá-se lá saber porquê, do factor A.

O factor A, de arbitragem, pode manifestar-se sob formas tão diversas como Ivanov, Poll ou Batta. Há também que juntar o factor B, de Brasil, que nos diz que Kaká, Ronaldinho, Ronaldão, Juninho, Adrião, etceterazinho e etceterazão até não jogam mal de todo. Destacando pelo picotado e unindo a parte A com a parte B, o resultado praticamente certo e seguro é que o Brasil está, de facto, nas meias-finais. E, consequentemente, na final.

Razão tem o treinador do Gana, quando sugere que o árbitro vista a camisolita amarela. Nos jogos em que o Brasil está a jogar de amarelo, note-se, e não quando joga Portugal com a Holanda ou coisa que o valha. Quem já jogou futebol, como eu ou o Octávio Machado, por exemplo, sabe de que é que eu estou a falar. Mas eu explico, ou pelo menos tento. Cá vou eu.

Lá dentro do campo, no meio da confusão, há muitas jogadas em que a visão periférica ou a velocidade do lance (neste último caso, obviamente sem a participação de Ronaldo) faz com que um homem tenha que reagir ou optar quase por instinto, com base na cor de uma camisola que se vê fugazmente, que se vislumbra, mais do que se vê. Ora, numa situação dessas, o cérebro não tem tempo para processar informação demasiado complexa e entre a decisão e o gesto também não há tempo a perder. É aqui que o factor C, a cor da camisola, tem o seu efeito decisivo.

Exemplo: um homem prepara-se para receber a bola à entrada do meio campo contrário. Este homem joga por Portugal. Para não complicar desnecessariamente o exemplo, vamos supor que não se trata do Deco, pois o jogo é contra o Brasil e o exemplo já nos vai trazer confusão que basta. Para não ferir susceptibilidades, e porque para o nosso exemplo precisamos de um homem com visão de jogo e capaz de colocar a bola onde o pretende fazer, suponhamos que um homem é o Rui Costa.

Temos, portanto, Rui Costa na iminência de receber a bola à entrada do meio campo do Brasil. Mesmo antes do contacto com a bola, um homem olha em redor e pensa no que é que vai fazer com a dita bola, assim ela chegue a um homem. Por mera casualidade, Pauleta não está fora de jogo, e um homem apercebe-se disso. A bola chega a um homem. Um homem domina a bola, com aquela elegância só ao alcance de um Rui Costa, e endossa-a com a necessária dose de açúcar para o terreno livre à frente de Pauleta. Este faz o que tem a fazer, que é dar dois ou três passitos de corrida rumo a Dida e pregar com ela lá dentro. É o delírio entre aqueles sete ou oito mil tugas que assistem nas bancadas, até porque o jogo estava empatado e já não falta muito tempo para acabar.

O jogo estava e estará empatado por mais uns minutos, porque, como os espectadores lá em casa puderam ver, o lance foi prontamente anulado por fora de jogo. Acresce que, ao não ter suspendido o movimento de a meter lá para dentro nas quatro décimas de segundo posteriores ao apito do árbitro, Pauleta incorreu em sanção disciplinar, ou seja amarelo, e Portugal fica a jogar com 9 nos últimos minutos, porque o Pauleta já tinha amarelo e o Costinha ou o Petit já tinham sido devidamente expulsos na primeira jogada da segunda parte.

Como é que isto pôde acontecer a um homem, e logo a um homem chamado Rui Costa? Parecendo complicado, não é nada simples: naquela fracção de segundo em que analisou a situação, Rui Costa viu claramente que Juan e Lúcio estavam entre Pauleta e Dida. Não muito, mas estavam. Também viu Roberto Carlos e Cafú praticamente colados à linha de fundo, um de cada lado, mas optou, e bem, por não contar com eles para efeitos de fora de jogo, pois Roberto Carlos estava a apertar os atacadores e Cafú a vomitar ou a expectorar violentamente, ou seja, nem um nem outro têm participação activa na jogada. Claro que a lei do fora de jogo prevê essa excepção para quem ataca, e não para quem era suposto defender, mas um homem não pode esperar que uma equipa de arbitragem se vá lembrar de todas essas subtilezas, ao fim de mais de oitenta minutos de jogo, num lance que decorre no meio campo do Brasil. Naquela fracção de segundo, Rui Costa não se esqueceu de olhar para o bandeirinha e viu que este estava em linha com Juan e Lúcio, ou seja, em excelente posição para ver que Pauleta está em jogo. Logo, com base nestes pressupostos, um homem, Rui Costa, lança Pauleta. Um homem vê Pauleta embalar e metê-la lá dentro, vai direito a ele, no intuito de comemorar o golo, e não pode evitar algum desconcerto perante a visão de um árbitro com rosto perfeitamente impassível a mostrar o amarelo e logo de seguida o encarnado ao ciclone dos Açores.

O que aconteceu foi que o cérebro de um homem, mesmo sendo esse homem um senhor chamado Rui Costa, não conseguiu escapar à acção do factor C. Ao ver um tipo com equipamento Adidas preto e com uma bandeirola na mão, naquela fracção de segundo e entre tantas outras coisas que há para ver, o cérebro de um homem não consegue deixar de o classificar numa categoria diferente da dos tipos de amarelo da Nike. E assim se cai, como um patinho, na armadilha do fora de jogo.

Ao propor que o pessoal do apito e da bandeirinha envergue a camisola dos jogadores de campo da equipa pela qual efectivamente alinham, o treinador do Gana, na sua ingenuidade africana, não faz mais do que apelar ao bom senso e à verdade desportiva. No exemplo em apreço, não ficaria aquela sensação desagradável de mais um cambalacho a favor do Brasil, e sim algo de muito mais positivo: o justo valor de um terceiro central com a perfeita noção da colocação, capaz de jogar em linha com Juan e Lúcio, mesmo com uma bandeirinha na mão (o que deve complicar um bocadinho os movimentos). Claro está que, num jogo de amigos, não há cá essas paneleirices de fiscais de linha. Os foras de jogo são assinalados pelos defesas, levantando o braço, que foi o que fez o terceiro central, também referenciado como árbitro assistente.

Como diria o outro, au revoir.

27.6.06

Cambalaccio (do Grosso)


Era um italiano, um australiano e um espanhol. O italiano, grosso, tropeça no australiano, vai o espanhol e marca penálti. Parece anedota. E é. Mas uma forra em râguebi havia de ter a sua piada.

24.6.06

Argentália 2, Mezcaléxico 1


Se a vida, que é a vida, é tantas vezes injusta, por que raios havia o futebol de ser justo? E há outra coisa: que putapé, señor Maxi Rodriguez!

18.6.06

Também quero que este se foda


Não há como o desporto para despertar em nós os mais nobres sentimentos. Fair play e essa coisa toda. No meu caso, uma vitória como a de hoje ganha ainda mais sabor quando lhe consigo associar a derrota de alguém em particular. Espero muito sinceramente que o inenarrável senhor Ahmadinejad tenha depositado algumas esperanças numa hipotética carreira da selecção iraniana e, como tal, tenha sentido hoje como sua uma bela derrota. Para cerejar o bolo em beleza, só falta mesmo que Angola acabe de humilhar o Irão e, com uma ajudinha da nossa parte, faça o seu brilharete. Não que o Eduardo dos Santos mereça muito mais que o Ahmadinejad, mas a racionalidade que (lá está) se foda.

7.6.06

Eu quero que o Scolari se foda



Eu podia não ter escrito isto, e ainda por cima logo no título. Mas também podia fazê-lo. Fi-lo. Porquê? Por ser verdade, claro, mas não só. Um homem não se põe a escrever as verdades todas que lhe ocorrem. Fi-lo, antes do mais, por uma questão de princípio e por querer assinalar uma efeméride. O princípio é simplicíssimo: chama-se liberdade de expressão e é sempre das mais fáceis de pôr em causa e das mais fáceis de deixar que sejam postas em causa. A efeméride, mal e porcamente resumida, é o que se segue:

Em 1971, a 7 de Junho, o Supremo dos EUA considerou que a Primeira Emenda abrangia a caralhada por escrito (vulgar writing). Três anos antes, um tal de Paul Cohen tinha sido acusado de e condenado por entrar numa sala de audiências com um blusão em que se lia "Fuck the Draft". Ao entrar na sala, o Cohen tinha tomado a precaução de despir o blusão e dobrá-lo sobre o braço. Mas um zeloso agente da autoridade, que o tinha visto no exterior do edifício, entregou ao juiz um bilhetinho em que lhe sugeria que Cohen fosse chamado à pedra por desrespeito pelo tribunal. O juiz ignorou o bilhetinho, o polícia prendeu Cohen à saída da sala, o Cohen foi julgado, alegou que o blusão era a forma de dar a conhecer ao público a profundidade dos seus sentimentos sobre o recrutamento para o Vietname, foi condenado a 30 dias de prisão, recorreu para o Supremo e ganhou à tangente, por 5-4.

Gosto da moral desta história. Faz-me acreditar que, por cada quatro filhos da puta do calibre do polícia, do Scolari, do Madaíl e daquele cabrão que me ocorre e que nem sequer merece ser tratado pelo nome, há cinco pessoas normais neste mundo.

Não, o Desinfeliz não acabou de vez. À laia de prova de vida, ou de prova de esforço, eis Tuguíadas I, 87


Vem depois a contenda mais famosa,
O tal jogo em que entrámos enfardando
Três secos da turminha mais merdosa,
Mas que quase nos ia eliminando:
Foi por pouco que não levámos tosa,
Não fora o nosso Eusébio, que marcando
O primeiro e o segundo, ‘inda o terceiro
E o quarto, só deixando o derradeiro.

(...)